November 13, 2025

BRASIL: NOTAS SOBRE MONTANHAS, TERREMOTOS E A ILHA DO MARAJÓ

Nesta postagem, abordaremos três temas que precisam ser esclarecidos para fundamentar discussões deste blog e de projetos irmãos: a nomenclatura de montanhas, a listagem correta dos maiores terremotos do Brasil e a verdadeira linha de tensão da Ilha do Marajó.


MONTANHAS

No campo da geografia física, poucos temas geram tanta confusão quanto a definição precisa de montanhas e de seus pontos culminantes. Termos como chapadas, serras, montes, maciços e picos costumam ser usados de forma indistinta ou ambígua, criando incerteza e fragilidade na hora de nomear esses elementos do relevo. A situação se complica ainda mais quando se tratam de pontos culminantes individuais: em torno do Everest, por exemplo, existem dezenas de protuberâncias topográficas que poderiam ser consideradas “picos” mais altos que o K2, o que faz com que os supostos 10 ou 20 maiores pontos culminantes do planeta se concentrem todos na mesma área — algo que, do ponto de vista nomenclatural e conceitual, não faz sentido algum.

O uso do termo pico para definir esses elementos geográficos é problemático, pois muitos maciços apresentam vários picos tão próximos e integrados entre si que não podem ser considerados unidades independentes. Além disso, algumas feições topográficas nem sequer possuem um pico distinto, como ocorre no Monte Roraima ou na Pedra da Mina. A palavra monte também gera conflitos, já que diversas formações que recebem esse nome não atendem aos critérios esperados para um “monte” propriamente dito — o prórpio Monte Roraima, por exemplo, não se enquadra nessa categoria de forma rigorosa.

A nomenclatura das montanhas e dos pontos culminantes do Brasil é amplamente conflituosa e ignora, em muitos casos, o critério da distinguibilidade entre os elementos. O Pico 31 de Março, por exemplo, é topograficamente indistinguível do Pico da Neblina, mas ainda assim é tratado como o 2º mais alto ponto culminante do país. O mesmo ocorre com o Pico do Calçado e o Pico do Cristal, que não se diferenciam de forma topográfica do Pico da Bandeira, embora apareçam entre os dez maiores pontos culminantes do país. Situação semelhante se observa na Serra do Itatiaia: a Pedra do Sino do Itatiaia e o Morro do Couto não podem ser distinguidos topograficamente do Pico das Agulhas Negras como unidades autônomas, embora frequentemente sejam listados como tais.

Para evitar essas inconsistências e trabalhar apenas com unidades realmente distintas, propomos aqui o conceito de pontos maximais: os pontos mais altos de unidades topográficas que podem ser diferenciadas de forma objetiva, onde cada unidade é monorrepresentada por seu ponto de maior altitude. A partir desse critério, o Pico da Neblina e o Pico 31 de Março passam a ser entendidos como parte de uma mesma unidade topográfica (um excelente texto que já versava sobre a insuficiência do 31 de Março pode ser visto em Alta Montanha), cujo máximo de relevo é o próprio Pico da Neblina. Da mesma forma, o Pico do Calçado, o Pico do Cristal e o Pico da Bandeira pertencem a uma única unidade, representada pelo máximo de relevo correspondente — o Pico da Bandeira. E assim sucessivamente para os demais casos.

A delimitação entre unidades topográficas pode ser simples em alguns casos, mas também pode gerar confusão, especialmente quando envolve feições que recebem múltiplos nomes — montanha, monte, pico, serra, tepui, chapada, entre outros. Quando houver ambiguidade, a análise necessariamente envolve certa subjetividade e depende do bom senso, não sendo objetivo deste texto aprofundar tais critérios. Dentro dessa perspectiva, a nomenclatura de pontos maximais deve ter prioridade sobre outras designações referentes a pontos mais altos, como 'pontos culminantes', 'picos culminantes' ou 'montanhas mais altas'.

Nestes termos, podemos então listar os pontos maximais do relevo do Brasil — levando em conta a numeração da lista destaca em Wikipedia para os 15 primeiros da lista e seus equivalentes — na ordem:

1. Pico da Neblina (2995m, 1º e 2º) ‣ inclui o Pico 31 de Março (2º, 2974m).

2. Pico da Bandeira (2891 m, antigo 3º) ‣ inclui o Pico do Calçado (4º, 2849m), Pico do Cristal (7º, 2769m), Morro da Cruz do Negro (13º, 2658m) e Pico do Tesouro (14º, 2620m).

3. Pedra da Mina (2798 m, antigo 5º)

4. Pico das Agulhas Negras (2791m, antigo 6º) ‣ inclui o Morro do Couto (9º, 2680m), a Pedra do Sino do Itatiaia (10º, 2670m) e o Pico do Altar (12º, 2665m).

5. Monte Roraima (2734m - porção brasileira)

6. Pico dos Três Estados (2665m, antigo 11º) ‣ apesar de seu pico estar a apenas 5 km do pico da Pedra da Mina, ele é suficientemente distinto devido a um profundo vale separando ambos.

7. Pico Santo Agostinho ou Garrafão (2425m, antigo 15º) ‣ maior máximo de relevo brasileira inteiramente contida num mesmo estado.

8. Pico dos Marins (2421m, antigo 16º)

9. Pico Maior de Friburgo (2366m, antigo 17º)



TERREMOTOS DO BRASIL APÓS 2017

Um tema especialmente marcado por desinformação, listas conflitantes, dados imprecisos e até certo sensacionalismo é o dos terremotos no Brasil. Diferentes plataformas — muitas delas internacionais — divulgam registros de supostos eventos acima de 7 graus na escala Richter em território brasileiro, frequentemente com datas que não correspondem às reportagens da imprensa. Esta, por sua vez, também contribui para ampliar a confusão sobre o real histórico sísmico do país.

Entre as referências mais citadas estão Biggest Earthquakes Near Brazil (BE, Earthquaketrack), que atribui 23 terremotos ao Brasil com magnetude acima de 6, e Latest earthquakes near Brazil today (LT, Brazil Earthquake Report), que aponta 5 ocorrências no país. Embora mantidas por instituições respeitáveis, ambas apresentam inconsistências importantes. Para trabalhar com dados consolidados e tecnicamente mais confiáveis, adotamos aqui a compilação de Preve, D’Espindula(b) e Valdati (Geografia Física e Desastres Naturais, 2017), que reuniu todos os terremotos superiores a 5 Mb (Magnitude de Ondas de Corpo) registrados no Brasil entre 1900 e 2017, e os dados das plataformas supracitadas para dados após 2017: LT com M6.8/050119 (Tarauacá, VER), M6.6/200124 (Ipixuna, VER), M6.5/280124 (Tarauacá, VER), M6.5/070622 (Feijó, VER); e BE com M6.8/05012019 (Tarauacá, VER), M6.6/20012024 (Ipixuna, VER), M6.5/08062022 (Feijó, VER), M6.5/28012024 (Tarauacá, VER).



ILHA DO MARAJÓ

A classificação da ilha do Marajó apresenta ambiguidades porque se trata de uma ilha fluviomarinha com uma complexa rede hidrográfica em sua porção sudoeste. Nessa região, canais, furos e regatos interconectam os fluxos de água e acabam gerando novas ilhas. Ainda não há discussão científica consolidada sobre se essas ilhas secundárias podem ser consideradas unidades independentes da ilha principal.

Neste texto, adotamos o entendimento de Marajó em sua extensão integral, delimitando-a, pelo sudeste, pelo Furo dos Macacos — cuja profundidade e dinâmica de fluxos justificam essa fronteira. Os cursos d’água de menor profundidade presentes no interior da ilha são aqui tratados como elementos secundários, insuficientes para redefinir ou fragmentar o conceito da ilha do Marajó.